UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UnB
FACULDADE DE EDUCAÇÃO – FE
GRUPO DE ENSINO-PESQUISA-EXTENSÃO EM EDUCAÇÃO POPULAR (JOVENS, ADULTOS E CRIANÇAS) E ESTUDOS FILOSÓFICOS E HISTÓRICO-CULTURAIS - GENPEX
PROPOSTA DE TRABALHO
1. ANTECEDENTES
O GRUPO DE ENSINO-PESQUISA-EXTENSÃO EM EDUCAÇÃO POPULAR E ESTUDOS FILOSÓFICOS E HISTÓRICO-CULTURAIS – GENPEX foi constituído em Abril de 200 e está registrado no CNPq.
O GRUPO é o desdobramento histórico do Projeto Paranoá de Alfabetização e Formação de Alfabetizadores (as) jovens e adultos de camadas populares: uma iniciativa do CEDEP – Centro de Cultura e Desenvolvimento Popular Paranoá – UnB.
O CEDEP demandou a Faculdade de Educação da UnB em 1986, que aceita i desafio na pessoa da professora Marialice Pitaguari, que permanece até 1990, quando por razões de saúde retorna à sua cidade de origem.
A partir dessa data, o professor Renato hilário dos reis dá seqüência ao trabalho que vem contando com a participação e colaboração de inúmeros professores, servidores, alunos e diversos profissionais, conforme relação anexa.
Em 2000, junta-se ao Projeto Paranoá o Programa de Preparaçãoà Educação Básica do Servidor da UnB, PROCAP/ SHR, coordenado pela professora Maria Elisa Eichler.
O texto da proposta de trabalho que se segue está dividido em cinco partes:
A 1ª trata dos pressupostos que constituem o referencial indicativo do GRUPO: Cconceitos de Civilização, Ser Humano, Sociedade, Educação, Universidade e Educação Popular (crianças, jovens e adultos), discutidos de forma sintética e concisa.
A 2ª parte trata dos objetivos. A 3ª parte relaciona a produção acadêmica até então desenvolvida. A 4ª caracteriza a natureza dos seus recursos humanos. E, por último, o documento finaliza com uma bibliografia básica, orientadora do Grupo de Ensino-Pesquisa- Extensão em Educação Popular e Estudos Filosóficos e Histórico-Culturais.
2. PRESSUPOSTOS
2.2 CIVILIZAÇÃO
Entendemos que a civilização fundada na hegemonia da razão instrumental, tanto de inspiração capitalista como socialista (URSS por Stálin), levou a humanidade a um impasse, à medida que representa uma separação entre razão e coração, homem e natureza, e à proposição de um homem: ser supremo do universo, dominador do universo e não universo entre os vários universos. Isto implicou uma relação predatória, depredatória com a natureza, o cosmos e o próprio semelhante da mesma espécie, num processo ôntico de reificação das relações, em que no fundo todos são objetos de consumo. Uma das conseqüências é que o homem se volta contra suas próprias condições de sobrevivência como espécie, não só no ponto de vista da relação com a natureza (stritu sensu), mas, também, com cada ser humano, nas relações do dia-a-dia, destituídas de subjetivação (construção de novas condições e possibilidades de convivência segundo Foucoult, ancorado em Nietzsche). A negação, medo, vergonha de qualquer ato verbal e não verbal (corpo-mente imbricados) ou como unidade psicossomática segundo Santo Tomás, em que implique o desarme interior para acolher e ser acolhido pelo e com o outro, numa dialogia dialética responsiva ativa conforme Bakhtin, em que eu constituo o outro e este, simultaneamente, me constitui. Ou seja, não há lugar para amar o ser amado. Há lugar para poder, saber, apropriados pela classe dominante, mas não para o amor como algo fundante e determinante da caracterização e formação histórica da própria espécie. Amor que ilumina a ordem econômica, social, cultural e o plano das relações sociais de produção, em seu sentido lato (MARX_ENGELS). De tal forma a superar a hegemonia do capital sobre trabalho, a dicotomia trabalho intelectual e trabalho manual e com isso passarmos a entender o trabalho, nele incluindo todos os seus frutos , inclusive, a produção da riqueza como fluxo múltiplo de energias produzidas individual e coletivamente pelo ser humano (homem e mulher). Energias estas catalizadas-canalizadas na construção da aprendizagem, desenvolvimento e exercitação de uma civilização da solidariedade e complementariedade mútuas, em que as incompletudes de cada um são completudes, à medida que se completam com a incompletude/ completude do outro, sempre incompleto. Com isso, há lugar para a humildade de se compreender, poder e saber como algo a serviço de cada um e do conjunto da civilização, porque marcados pela dimensão de uma amorização sempre cada vez mais intensa e crescente. Por uma civilização da amorosidade, pois!
2.3 SER HUMANO
Diante do pressuposto anterior, vale dizer que os estudos histórico-culturais, fundados na antropologia, sociologia, na economia política, lingüística, filosofia e descobertas recentes das ciências físico-biológicas, vêm mostrar que o homem é um ser historicamente diferenciado na evolução de espécie. Não deixou de ser animal. É um animal, entre outros animais. É um ser, entre outros seres que compõem o conjunto da natureza do planeta. O que faz afeta todos. E o que os outros fazem, o afeta também. Mas, tem sua especificidade , que é de planejar e prever as transformações do conjunto da civilização endo universo em que está inserido. Daí, sua responsabilidade ética de ao se pensar, não se pensar isolado dos outros seres humanos (homens e mulheres). De certa forma, lembrando Kant: meu ato à medida em que repercute em tudo e em todos, como deve ser feito e encaminhado? Evocando São Paulo, somos comunhão entre os que estão em uma determinada forma da vida, e outros que já passaram desta. A te entre os que já se foram e nós que estamos na passagem há uma repercussão e inter-relação. A história não é só minha história. É a história dos que já vieram e estão na história. É minha e dos outros que trazemos dentro de nós, a história dos nossos antepassados e ancestrais. O presente é passado, é presente e é futuro simultaneamente. É uma práxis em movimento contínuo de vozes e seres em constante interlocução e constituição. Daí entendermos que o ser humano (mulher e homem) se constituiu, está se constituindo e se constitui no conjunto das relações sociais historicamente acumuladas e que estão se acumulando, na dialogia dialética de Bakhtin ou de Paulo Freire, em que estou a busca sempre do completo, mesmo me sabendo incompleto. E isso, só é possível, na relação dos sujeitos-sujeitos e contexto histórico-cultural em que estão inseridos concreta e historicamente.
2.4 SOCIEDADE
A sociedade é a organização e o funcionamento das relações sociais em um determinado tempo e época. Como tal, tem sua especificidade e condições objetivas, datadas historicamente. No tempo atual, as marcas da nossa sociedade mundial e brasileira, indicam a manutenção de uma questão dorsal, que aparece com a superação do feudalismo, que é o capitalismo. De certa forma e em suas devidas proporções, o capitalismo trouxe um novo tipo de dominação, não mais do senhor sobre o servo, mas do capital sobre o trabalho. Esta contradição se acentuou nos últimos 20 anos, com as alterações da geo-política mundial. Com isso, se acentuou o processo de exclusão entre povos e países que detêm o capital, ciência, poder e tecnologia e os que não detém na mesma proporção. De tal maneira que, na história da humanidade, nunca se produziu tanto e, ao mesmo tempo, nunca se morreu tanto em decorrência das condições de vida. O Brasil não é diferente. 1% da população brasileira, ou seja, 1 milhão e 600 mil pessoas detêm 57% da riqueza nacional, o que leva a um número que cada vez menor de pessoas excessivamente pobres. Como diz Santo Tomás, o ser humano tem que ter o mínimo necessário, inclusive para exercer a virtude. Ou como diz o livro da Sabedoria: “Senhor, eu não peço muito, nem pouco, mas, o necessário para viver”. Por isso mesmo, a nossa posição por uma sociedade em que todos têm o necessário para viver, existir e desenvolver. Um milênio sem exclusões. Todas. Inclusive e sobretudo as afetivas/ amorosas.
2.5 EDUCAÇÃO
Entendemos segundo Gramsci, que a educação é um dos organismos superestruturais que pode contribuir à transformação da civilização, do homem, da sociedade. Não é carro-chefe: “tudo se pode através da educação”. Isto seria cair em um otimismo pedagógico ingênuo, que historicamente já revelou sua insuficiência. Nem também, somos daqueles “de que nada se pode transformar com a educação”. Ela tem sua possibilidade e seu limite. Que aumenta ou diminui dependendo das articulações que se desenvolve com outros organismos da sociedade civil (movimentos populares, igrejas, associações), e à medida que a sociedade civil se mobiliza, se organiza e trabalha no sentido de tornar fato os direitos e deveres de todos, particularmente os mais excluídos entre os excluídos, num país que é hoje todo exclusão, com exceção daqueles que se submetem de forma irrestrita e submissa às regras do capital.
Se a sociedade é a totalidade das relações sociais e o homem é um agregado de relações sociais como diz Vygotsky, a educação ao trabalhar processos de aprendizagem e desenvolvimento poderá estar contribuindo com a transformação dessas relações sociais, em nível macro e micro. Ou seja, os sujeitos (homens e mulheres) constituem essas relações, estão nessas relações sociais, são constituídos por essas relações. E nessa contradição de construir e ser construído, o quebrar da hegemonia vigente em cada um é o quebrar em vários...vários... é o quebrar dentro da própria estrutura econômica-social que estrutura, segundo Foucault, mas que também é estruturada. Pode ser estruturante e reestruturada. As revoluções são moleculares diz Guatarri, e Foucault afirma: não há revolução que não venha da base. Do contrário, é golpe de estado, ou vanguardismo de intelectuais de direita ou de esquerda, que falam e decidem por outros, que continuam sem vez, voz e decisão segundo seus interesses e necessidades de vida. E isso não é demnocracia. Como diz Bogomoletz, o princípio da democracia é a escuta. A escuta elaborante-elaborativa e em elaboração. Sem escuta, não pode haver fala, verbalização co-partilhada. Daí, educação constituída por todos os sujeitos e trespassando cada relação e conjunto das relações em todos os momentos.
2.6 UNIVERSIDADE
Locus do Processo formativo: produzir saber, exercer poder, não isoladamente, em função da manutenção do “status quo”. Mas, processo formativo de desenvolvimento humano e de produzir um novo saber e uma nova relação de aprendizagem, caracterizados pela contribuição à transformação das relações sociais, no embate de forças que constituiem essas relações. Ignorar isso seria uma ingenuidade, nos diz Foucault. O intelectual, o aluno, o professor, o servidor técnico-admnistrativo, vivem a contradição de ter dentro de si o servir ao capital e ao trabalho. É uma situação dolorosa e extremamente difícil. Mas, como afirma Vygotsky, em cada ato humano há uma motivação afetivo-volitiva. Essa motivação do sujeito favorável à manutenção da ordem vigente, a universidade pode desenvolver com sua organização burocrática-acadêmica, o que pensam, fazem, sentem seus professores, alunos, servidores e dirigentes. Mas, pode também desencadear um processo diferente que vá ao encontro da contribuição à construção de uma civilização, homens e sociedade, ancorados em relações amorizantes/amorizadoras, preservando a sobrevivência da espécie, do planeta e ajudando a transformar a ordem vigente, a começar das microrrelações.
2.7 EDUCAÇÃO POPULAR ( JOVENS, ADULTOS E CRIANÇAS)
( Excluído pela própria lógica do mundo de produção e sistema educativo)
Comecemos pelo que diz o querido Paulo Freire, nosso mestre maior em Educação Popular, sob o título de “Educação de Adultos: algumas reflexões”, no livro Educação de Jovens e Adultos: teoria, prática e proposta”, página 15-17, organizando por Moacir Gadotti e José Eustáquio Romão, Editora Cortez- Instituto Paulo Freire, e publicado em maio de 2000:
“ No Brasil e em outras áreas da América Latina, a Educação de Adultos viveu um processo de amadurecimento que veio transformando a compreensão que dela tínhamos pouco anos atrás. A Educação de Adultos é melhor precebida quando a situamos hoje como Educação Popular . [...] O conceito de Educação de Adultos vai se movendo na direção do de Educação Popular na medida em que a realidade começa a fazer algumas exigências à sensibilidade e à competência científica dos educadores e das educadoras. Uma destas exigências tem a ver com a compreensão crítica dos educadores do que vem ocorrendo na cotidianidade do meio popular. Não é possível a educadoras e educadores pensar apenas os procedimentos didáticos e os conteúdos a serem ensinados aos grupos populares. Os próprios conteúdos a serem ensinados não podem ser totalmente estranhos àquela cotidianidade. O que acontece, no meio popular, nas periferias das cidades, nos campos __ trabalhadores urbanos e rurais reunindo-se para rezar ou para discutir seus direitos __ nada pode escapar à curiosidade arguta dos educadores envolvidos na prática da educação popular.”
(...) Educadores e grupos populares descobriram que Educação Popular é sobretudo o processo permanente de refletir a militância; refletir, portanto, a sua capacidade de mobilizar em direção a objetivos próprios. A prática educativa, reconhecendo-se como prática política, se recusa a deixar-se aprisionar-se na estreiteza burocrática de procedimento escolarizantes. Lidando com o processo de conhecer a prática educativa é tão interessada em possibilitar o ensino de conteúdos às pessoas quanto em sua conscientização. Nesse sentido, a Educação Popular de corte progressista, democrático, superando o que chamei, na “Pedagogia do Oprimido” , educação bancária, tenta o esforço necessário de ter no educando um sujeito cognoscente, que, por isso mesmo, se assume como um sujeito em busca de, e não como a pura incidência da ação do educador. Desta forma são tão importantes para a formação dos grupos populares certos conteúdos que o educador lhes deve ensinar, quanto a análise que ele s façam de sua realidade concreta.”
(...) implica uma diferente compreensão da História. Implica entendê-la e vivê-la, sobretudo vivê-la, como tempo de possibilidade, o que significa a recusa a qualquer explicação determinista, fatalista da história. Nem o fatalismo que entende o futuro como repetição quase inalterada do presente, nem o fatalismo que percebe o futuro como algo pré- dado. Mas, o tempo histórico sendo feito por nós e refazendo-nos enquanto fazedores dele. Daí que a Educação Popular, praticando-se num tempo-espaço de possibilidade, por sujeito conscientes ou virando conscientes disto, não possa prescindir do sonho.”
(...) É possível vida sem sonho, mas não existência humana e História sem sonho.”
Cremos que a posição de Freire sobre Educação Popular deixa claro que ela não pode se restringir ao cumprimento dos programas, planos de curso, planos de disciplinas, planos de aula, elaborados à revelia dos educandos, numa concepção autoritária e bancária da educação. E isto se aplica tanto a iniciativas da educação formal como não formal. Iniciativas do sistema público ( governos federal, estaduais, municipais) bem como de iniciativas da sociedade (movimentos populares, organizações patronais, sindicatos, partidos etc.)
Historicamente, na América Latina e particulamente no Brasil a Educação Popular surgiu como contraponto à educação formal, porque esta se preocupava apenas em transmitir conteúdos de interesse daqueles que mandavam ou exerciam o poder.
Ou seja, a educação formal era, como continua sendo, em sua predominância, uma maneira dos dominadores de uma sociedade manter dominadas a maioria das pessoas, dentro da lógica de um modo de produção. Modo de produção este, que faz com que a nível mundial e nacional, a riqueza se concentre cada vez mais nas mãos de alguns, enquanto a maioria da população fica cada vez mais pobre.
A Educação Popular veio como reação, embate, e confronto do dominado contra o dominador. Voz e Vez dos excluídos. Voz e Vez dos mais pobres. Daí o sentido emancipador/transformador da Educação Popular. Ou seja, a contribuição que a educação pode dar à transformação da sociedade. Produzir riqueza? Sim. Mas produzir riqueza, aumentando a produção da riqueza (aqui entendida em seu sentido amplo: econômica, política, cultural, educacional, saúde etc.) e distribuindo-a de forma a não ocorrer um distribuição injusta dessa mesma riqueza: alguns com excesso e muitos com escassez.
Assim posto, a Educação Popular é também escolarização do trabalhador. Mas, não no sentido bancário, de apensa depositar conhecimentos, transmitir informações aos educandos. Se transmito conteúdos e toda minha avaliação é centrada, na cobrança estrita e restrita desses conteúdos, eu estou fazendo educação bancária. E neste aspecto, estamos contra o sentido da Educação Popular historicamente desenvolvido na América Latina e, particularmente, por Paulo Freire no Brasil.
Agora, se o educando (crianças, jovens e adultos0 que tem um conhecimento histórico acumulado, e com este conhecimento dialoga com o conhecimento histórico acumulado do educador, e daí um e outro vão tendo relações de alternância no ensinar/aprender, transformando a realidade em que vivem, aí temos um educação popular. Isto pode acontecer, quer seja em iniciativas formais ou não formais de educação.
Diante do exposto a discussão da Educação Popular não se restringe a um mero sentido de uma divisão de educação formal, não formal, popular, informal, indígena, camponesa, trabalhadores da indústria, da construção civil, etc. A questão está, pelo menos, para nós, no seguinte: A Educação se dá na relação sujeito-sujeito, sujeitos-sujeitos, sujeitos-sujeitos e suas relações sociais. Relações que se dão dentro de uma especificidade histórica e culturalmente datada. Ou seja, a cada tempo, a cada época, a cada momento, essas relações tem uma características e aspectos próprios na família, no trabalho, na escola, no conjunto de uma determinada sociedade.
Essas relações são de contradição e de conflito que são a base de organização e funcionamento da totalidade dessas relações sociais, que é o conjunto da sociedade. No conjunto dessas relações entre e com os vários sujeitos pode acontecer, de forma predominante, a construção cotidiana da manutenção, perpetuação e ampliação da sociedade em que nasceram e cresceram. Ou pode na melhoria e superação – a cada momento, segundo, minuto, hora, dia, meses e anos – da sociedade, em que estão inseridos desde a sua concepção. É nessas relações sociais que o ser humano se constitui, nos assegura Vygotsky. E essa constituição é histórica, permanente e culturalmente desenvolvida.
A questão essencial, pois não é saber, se a educação formal, não formal, informal, popular, à distância, etc. Toda educação só se dá presencialmente, ou seja, se distância entre você e o (a) outro (a) e vice-versa. Enfim, sem distância e distanciamento entre todos nós, no movimento recíproco de acolher ao (a ) outro (a) e ao mesmo tempo ser acolhido pelo (a) outro (a). Perto ou longe física e geograficamente pode corresponder; estar longe ou perto do (a) outro (a), no sentimento que tenho por, com e no coração.
Por isso, a coisa mais perversa e terrível, a barbárie mais refinada ocorrente na sociedade contemporânea é a do abandono, rejeição, desconsideração, isolamento, não-amor, a que cada vez mais as pessoas são submetidas. Fato recente ( muito triste por sinal, como tantos outros) de notoriedade internacional: um senhor banqueiro dos mais ricos do mundo, morreu isolado e abandonado dentro da própria casa, cercado de uma porção de segurança. Se isto pode acontecer com o mais rico, imagine com o mais pobre, o excluído com o qual trabalhamos na educação popular de jovens, adultos e crianças. Excluídos econômica, política, cultural, educacional e afetivo-amorosamente do conjunto das relações sociais. Excluído-Incluído. Pois sua exclusão é a forma de estar incluído na sociedade capitalista atual.
Daí, ser um silenciado, com uma auto estima muito baixa, se achando consciente ou inconscientemente o “lixo do mundo”, o “leproso”, do qual todos têm medo de chegar. Dessa forma é jogado nas periferias das cidades. Abandono da e na família, no trabalho, nas e das igrejas, e sobretudo dos dirigentes das instituições várias da sociedade, incluindo as governamentais, em nível federal, estadual e municipal.
Para quem trabalha diretamente com os mais excluídos entre os excluídos, num país que é todo exclusão, sabe-se o quanto abandono, desleixo e desconsideração humana e pública, quanto sofrimento está sendo produzido nos setores mais pobres da população urbana e rural, pela natureza das várias políticas públicas vigentes. O excluído não tem o poder dos Estados Unidos e do FMI para negociar com o governo brasileiro suas necessidades. Os atos de governo por esquecerem este princípio constitucional, consagrado no mundo inteiro, gera no excluído um sentimento de decepção e desilusão com aqueles que elegeram.
A repercussão na vida dos excluídos, destes atos dos governantes oportuniza que desenvolvam a consciência de que os dirigentes dizem e fazem muitas coisas, mas, estas nunca melhoram a condição deles, em seu conjunto. Assim exposto e utilizando uma passagem bíblica, os excluídos se sentem como ovelhas sem pastor. Abandonadas pelo pastor em suas necessidades e dificuldades de vida, o que é ainda pior.
Por isso mesmo, a responsabilidade e a carga que se sobrepõe sobre um educador popular é tão pesada. O não escolarizado jovem, adulto e criança carrega dentro de si, toda uma negatividade da estrutura econômica, política, social e cultural em que, a duras penas vive e sobrevive. Mas, sobretudo, não se sente amado, dificilmente reconhecido por alguém e como alguém.
Daí a defesa que em qualquer educação e no caso específico da educação popular, a acolhida e acolhimento humano-existencial e entre os sujeitos se constituir uma das pedras angulares, um dos eixos fundantes, para não dizer a questão basilar, à sustentação da possibilidade da produção do sucesso humano-profissional-escolar dos, com e pelos excluídos.
Não é produção do sucesso porque se repete conhecimento, mas porque se produz conhecimento, reconhecendo e resgatando o saber que os excluídos trazem, têm, produzem em seu dia a dia e continuam a produzir, à medida que o processo de aprendizado e desenvolvimento na escola e na sociedade, dá sequência a esse movimento práxico.
Não é uma produção de sucesso, porque se desenvolve a competência dos excluídos para um dia exercer poder, reivindicar seus direitos. Mas, porque exercitam e desenvolvem poder, à medida que suas vozes são ouvidas. Estão presentes nas decisões cotidianas do seu processo de aprendizagem, desenvolvimento e vida.
Não é uma produção de sucesso, porque se resgata a subjetividade, se desenvolve a afetividade do excluído, para que a exerça com os outros. Mas, porque, a partir do primeiro dia que eles chegam a uma iniciativa de educação popular, cada um deles já tem nome, é chamado por este, é notado e reconhecido quando fala verbal ou não verbalmente. Cada um se sente importante, talvez, pela primeira vez na vida, porque tem o reconhecimento dos vários sujeitos que estão participando de sua convivência escolar e de vida.
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